Alguns pios defendem que as reflexões
bíblicas e as metáforas nela contidas são atemporais e que não devem ser
interpretadas apenas como história. Crenças a parte eis que Philip K Dick,
diante das abruptas mudanças que o mundo sofria no séc. XX, promoveu
ponderações sóbrias sobre o cristo unificado e até mesmo substituído por um
deus capitalista.
A presença de Cristo na obra o
Labirinto da Morte (A Maze of death)
revela que os conceitos religiosos que vigoraram no ocidente, especialmente nas
décadas de 60 e 70, são retomados como nostalgia ou revelados em mentes
perturbadas.
Nesta obra, o Rei dos Judeus, é um
mero coadjuvante até que seja provada a fé na máquina substituta ou quando os
novos conceitos de divindade apresentem falhas. Neste momento, aquele que até
então ocupava as linhas marginais da história é retomado com força e interesse
pelos céticos e beatos.
No Kibutz, cenário secundário em A Maze of death, o intercessor, alusão explícita
a cristo, aparece para poucos, auxilia em tarefas mundanas e dá conselhos. Sua
imagem assemelha-se mais a um mago que a um profeta. Entre os personagens ele é
um mistério como os politeístas, e entre eles eis que uns juram ter visto,
outros acreditam, mas nunca viram, e ainda há outros que não crêem em sua existência
e que toda a mitologia criada sobre o seu nome é puramente produto do senso
comum.
O cristianismo, assim como outros
temas polêmicos da contemporaneidade do autor, é utilizado como plano de fundo
nas fantásticas aventuras em tempos longínquos que Philip K Dick trás à tona
para sugerir-nos respostas cognitivas a partir de análises concretas em um
universo completamente disfórico. Como se esta ausência da realidade fosse a
melhor maneira para entendermos o que nos circunda.
A sugestividade dos termos análogos
sobre o cristianismo presentes na obra nos conduz as percepções racionais
diante das distorções figurativas que os elementos de tempo e espaço promovem em
uma breve leitura.
Seguindo o princípio de Berman que
afirma “o moderno é uma vida de paradoxos e contradições” (BERMAN 1986),
pode-se observar quais contradições e o porquê de cada uma considerando o
universo de reflexos de PKD em instantes complexos de sua sanidade ou da
sanidade da sociedade em que estava inserido. Os antagonismos sobre o tema
geram produtos de construção filosófica que promovem, na obra, ações
degradatórias que, segundo Subirats, em sua obra Vanguarda mídia e metrópole, não passam de sublimes transcendências
humanas (SUBIRATS 1993).
Philip K Dick enfatiza a discussão
sobre o cristianismo em A Maze of death ao teorizar, simbolicamente,
concepções cristãs e pós-cristãs em objetos de escrita que fundamentam as
doutrinas exibidas e sugeridas. Se considerarmos que, segundo Barthes, não
existe linguagem escrita sem rótulo (BARTHES 1953), não poderemos deixar de
analisar suas intenções discursivas e, de certa forma, até panfletária para a
transformação religiosa e filosófica que o mundo enfrentaria nas décadas
correntes.
Dessa forma os pensamentos
vanguardistas que fundamentaram a contemporaneidade do autor, suas reflexões
religiosas antagônicas a sociedade e sua fundamentação teórica por meio da
criação-fictícia de documentos comprobatórios, são as bases teóricas para a
leitura dessa obra que vai muito além de puro entretenimento..
O público-alvo das obras de PKD, a
juventude, sempre foi o leitor que, confiado de corpo, alma e ideologia nas
suas concepções de mundo, deseja transformar e por conta disso, mantém sua
horta intelectual exposta e acessível aos atrativos da literatura que exibe um
mundo completamente modificado pelos avanços tecnológicos.
PKD pode ser amado ou odiado, mas de
forma alguma ignorado.
O labirinto da morte é a metáfora da vida, cujos participantes insistem em buscar o significado fora dela, para dar
sentido às suas ações vazias e seus mecanicismos argumentados.
Uma leitura surpreendente e inesquecível.