Trabalho ou Sacrifício? Qual dos dois lhe parece mais motivador?


Conhecer a origem das palavras, nos permite compreender como o seu desenvolvimento foi lhe ofertando novos significados e, assim, podemos mensurar o quanto o uso dela na atualidade e afastou do sentido original, tornando-se às vezes antagônica ao senso formador do termo. Assim, vejamos nesse breve texto como as palavras “Trabalho” e “Sacrifício” atendem hoje a sentidos um tanto quanto disparatados de suas raízes.  

A palavra TRABALHO está localizada como derivação do verbo trabalhar, registrando-se no latim vulgar tripaliāre, interpretado como torturar, tendo raiz no latim tardio tripalium, em referência a um artefato de tortura usado pelos antigos romanos para castigar os réus ou condenados. 

O tripalium era um instrumento feito de três paus (tri = três e palium = palito). Neste aparelho de tortura, o criminoso era amarrado e depois submetido a chicoteamento. Não é de estranhar que, com o passar do tempo, a denominação tripalium do latim vulgar passasse a se chamar fadiga, sofrimento ou penalidade (esta denominação estava associada normalmente às atividades realizadas no campo e no regime de escravidão). 

Ao conhecer a etimologia de algumas palavras é produzido um efeito iluminador, já que a análise do termo permite compreender sua valorização ao longo da história. No caso da palavra trabalho, a mesma se refere à atividade transformadora que determina o rumo da humanidade. 

Na cultura greco-latina, a atividade trabalhista teve pouco reconhecimento social, pois o trabalho manual era considerado algo indigno e associado à condição de escravo. Se tomarmos como referência a mentalidade grega, um indivíduo que recebia salário de outro não podia ser considerado uma pessoa livre e, consequentemente, sua forma de vida não era estimulante (na pólis de Atenas, o trabalho manual e de pequenos comerciantes eram especialmente depreciados, porém a atividade artística gozava de prestígio e reconhecimento). 

Na civilização romana, mantinha-se o desprezo às atividades produtivas mais rudimentares, uma vez que a vida plena estava focada no lazer, na arte e na filosofia. Por outro lado, o termo negócio tinha um significado depreciativo que, na verdade, etimologicamente significa "negação do lazer" (negotium). 

Na visão judaico-cristã encontramos em Gênesis 3: 19 a interpretação cristã da ideia de trabalho. Textualmente quer dizer o seguinte: "Ganharás o pão com o suor da sua testa". Este versículo do Antigo Testamento é a consequência lógica da desobediência de Adão e Eva no Paraíso. Assim, a mulher foi castigada para dar à luz com dor e o homem foi obrigado a ganhar a vida com sofrimento. 

Para muitos o trabalho continuou sendo uma tortura 

A atividade de trabalho ideal é aquela que cumpre duas condições básicas: ser bem remunerada e eminentemente vocacional. 

Embora este ideal se concretize em alguns casos, para grande parte da população o trabalho é entendido como um suplício, ou seja, uma espécie de tortura que é tolerada por não haver outra alternativa. 

Poucos entendem o trabalho como sacrifício, e isso não é positivo, do ponto de vista etimológico.  

Até porque a palavra “sacrifício” é a justaposição de “sacro- ofício”, ou trabalho sagrado. A própria ideia de um trabalho sagrado pode gerar no indivíduo um senso de recompensa que  suplantaria a ideia de remuneração. Quero dizer, fazer o sacrifício pode ser mais recompensador ao sacrificado do que o trabalho ao trabalhador.  

Ainda que novos sentidos sejam atribuídos às palavras no transcorrer dos tempos, entender a razão de sua formação ajuda a resgatar a força semântica de sua criação e, consequentemente, nos permite refletir sobre o uso de tais termos. Se considerarmos apenas a etimologia das palavras, um “sacrifício” é bem mais motivador que um “trabalho”, e reconhecê-lo como tal não é desonra e tampouco motivo de lamentação, mas sim de orgulho por poder servir com sua força produtora à divindade, independente de qual seja ela.