A busca pelo ideal sugerida na estética classicista propõe, segundo a critica moderna, duas vertentes históricas. Alguns defendem que esta temática, por conta dos elementos classicistas que retomam princípios greco-romanos, baseia-se no idealismo platônico. Outros, no entanto, defendem que a raiz desta busca pelo ideal nas composições clássicas surge do monismo idealista, a existência de ser indescritível, na obra de Plotinio¹.
Essa divergência de opiniões adverte sobre a linha de pesquisa adotada por cada teoria. O tema presente na composição de Camões pode ser classificado como neo-platonismo. Variações naturais do pensamento de Platão que, unidas as sanções impostas pela era medieval, geraram essa nova linha cognitiva.

Vejamos o soneto Sete anos de Pastor inspirado em outro soneto , de Petrarca² , per Rachel ho servido e non per dia . Idealismo presente no sonho de Jacob e personificado na imagem de Raquel. No soneto de Camões o racionalismo, apesar do encantamento que sofre o protagonista,se faz presente na oferta de trabalho e esforço medido, pela conquista de seu ideal.Resultante de um equilíbrio sóbrio entre razão e sentimento.
Os dias, na esperança de um só dia,
passava, contentando-se em vê-la.
Jacob aprendia em sua racionalidade, mesmo com o passar do tempo, seu ideal de felicidade: Raquel. Vale Ressaltar que a mesma Raquel, no texto original em Gênesis é uma personagem que interage com o espaço, propõe ações, expõe opiniões e esboça atitudes próprias, enquanto que a Raquel de Camões transforma-se em um ideal de conquista, uma busca vital, uma promessa de felicidade.
O Soneto de Camões caracteriza-se como classicista pela estética,

Observando a temática, o poema apresenta uma retomada dos valores gregos, especificamente, sobre o ideal de Platão. A concepção de Mimesis também se faz presente no texto. Além do principio de harmonia que se estabelece nos antagônicos valores entre o “poder” e a submissão; segundo Nietzsche esta característica clássica é resultante de uma harmonia ampla em todos os setores da arte que, no seu entender, durante este período se faz muito mais apolínea do que dionisíaca. Se o equilíbrio esta na dosagem da moral com a paixão, ter caráter mais apolíneo é o que melhor contribui para tal pêndulo, haja vista que se existissem no mesmo patamar a paixão se sobressairia
Avancemos alguns séculos para observarmos a presença desta temática no movimento modernista. Usaremos como corpus de observação o poema de Manuel Bandeira Ultima Canção do Beco. Obra que apresenta características modernas na construção do pensamento introspectivo e retomada de valores do passado. Tais características somadas às temáticas singulares de Bandeira, como a solidão, o medo da morte, cotidiano em Santa Tereza, a família e a infância; temos aqui outra ilustração do idealismo Neo Platônico. O texto de Manuel Bandeira habita o eixo de sustentação da explanação anterior sobre as concepções modernistas do Segundo Período. Percebe-se uma preocupação mais amena com a quebra dos conceitos estéticos anteriores, pelo menos com certa exposição panfletária menor. Contudo os paradoxos e as antíteses, resultantes de sua bipolaridade, apresentam-se de maneira destacada, salvo nas articulações sobre a concepção do ideal , onde o poeta mostra-se convicto de sua afirmação.
A individualização de um universo paralelo,

Ultima canção do beco possuí um eu-lírico residente na formatação hermenêutica do autor e um espaço introspectivo constituído de valores diacronicamente imergentes.
O beco é a memória de um determinado momento da vida do “eu - lírico”; imagem que lhe vem carregada de lembranças boas e ruins, mas que o mesmo deseja que fique apenas nas lembranças. Um passado que quando presente fora presente não era tão poético assim.
O espaço mais sagrado do eu-lírico é o quarto. Nota-se o amor pelo seu universo que teve um significado muito maior do que as imagens mundanas. Já que o quarto permanecerá de forma imperfeita aos olhos do mundo das aparências. O universo criado para suprir a necessidade de afeto que outros espaços ofereciam. Os grandes instrumentos de construção do seu Eu ficarão vivos e continuarão com sua importância intocada.
Instrumentalizado com suas elipses, Bandeira reflete a exposição de um universo individualizado e delimitado ao quarto que morou. Além disso, apresenta a relação deste universo com a sociedade também resumida ao beco de sua infância. Os equilíbrios entre o sagrado e o profano , o ideal e o real ;presentes no poema nos comprova a retomada da temática clássica ,que reaparecerá , de uma maneira quase metalingüística,no poema de Mario Quintana Da realidade.
O olhar lúdico de Quintana serve-nos com uma interpretação palpável da teoria de Platão. Se o plano que se deseja de uma existência é a verdadeira razão dela mesma, pode-se afirmar que a realidade não satisfará, em momento algum, a trajetória de vida do homem. Conforme observamos no processo evolutivo do pensamento de Platão, que se agregou aos valores de ideais libertários do pensamento poético classicista, percebe-se um movimento de transformação da temática também nos moldes modernos.
As características modernas aplicadas ao texto de Manuel Bandeira, em partes, podem ser aplicadas ao poema Da Realidade de Mario Quintana.

O moderno e o pós moderno que adaptou o ideal no contexto de teorização, a fim de entendê-lo mais profundamente, ao contrário do classicismo que se preocupou , aparentemente em maior escala, com sua exibição;dando vida aos sentimentos e transformando-os em arte.
Notas:
1- Plotino (d.c. 205 - 270), natural de Licopólis, Egito, foi discípulo de Amônio Sacas por 11 anos e mestre de Porfírio. Plotino nos legou ensinamentos em seis livros, de nove capítulos cada, chamados de As Enéadas.
2- Petrarca- (1304-1374) ,foi um importante intelectual, poeta e humanista italiano, famoso, principalmente, devido ao seu Romanceiro. É considerado o inventor do soneto.